(ALTOS – PIAUÍ)

O Rio Surubim é um importante curso d’água que nasce na cidade de Altos, correndo suas águas para a cidade de Campo Maior, onde deságua no Rio Longá. Ainda no século XVIII, as suas margens já eram habitadas, sendo de extrema importância para o início das povoações que deram origem a Altos e Campo Maior.
Desde o início da colonização do Piauí, o Rio Surubim foi muito utilizado por índios, sertanejos e desbravadores que passaram ou viveram em regiões próximas de suas águas. Até hoje as pessoas servem-se de suas águas, em especial para banhos e pescaria.
Um dos trechos mais conhecidos pelos altoenses é o que fica a poucos quilômetros das terras urbanas altoenses, no sentido de quem vai para Campo Maior, pela BR-343. Ali existe uma pequena ponte de concreto, construída na primeira metade do século XX, por onde todos os dias inúmeros veículos transitam sobre as águas do Rio.
Ali naquela região contam-se histórias de assombrações e fenômenos sobrenaturais que desde tempos ancestrais assustam os que por ali passam. Conta-se que alguns anos atrás morava em uma casa ao pé de um morro que fica próximo da ponte um senhor de nome Raimundo, que teve longa vida.
À noitinha o velho Raimundo gostava de sentar à porta de casa, onde ficava sentado chupando um cigarro de fumo, olhando as estrelas ao som da cantoria dos grilos. Era um ritual que praticava todas as noites antes de dormir. Como vivia só, gostava de estabelecer uma sintonia entre seus sentidos e a natureza. Ficava ali por horas antes de ir dormir, apreciando a beleza das criações divinas.
Uma noite, Raimundo percebeu uma coisa muito estranha. No céu brilhava uma imensa lua cheia, de modo que pôde ver bem, embora estivesse um pouco distante. Uma figura estranha, um homem, que seguia pela estrada, no sentido Campo Maior-Altos, carregando à mão algo luminoso, que chamava a atenção em meio à estrada escura. Apesar de estranhar, Raimundo apenas ficou observando, e logo esqueceu a figura.
No entanto, na noite seguinte, no mesmo horário, novamente à porta de casa, Raimundo tornou a ver aquele homem caminhando tarde da noite, com uma luzinha na mão. O mesmo se deu noite após noite, ao longo de semanas e meses, sempre na mesma hora. O velho não conseguia entender o que uma pessoa podia fazer todo dia àquela hora, naquele lugar.
Um dia, Raimundo cedeu à curiosidade e, percebendo a aproximação do homem, resolveu segui-lo de longe, tomando cuidado para não ser percebido, querendo descobrir o que ele ia fazer.
Depois de um tempo caminhando pela estrada, quando já se aproximavam da ponte, viu o homem entrando na mata e descendo até o leito do rio, onde desapareceu nas águas escuras. Tudo que dava pra ver era o foguinho que o homem levava na mão, andando sob a água. O pobre Raimundo, sem entender muito bem, ainda ficou olhando de longe para ver se ele voltava à tona, esperando um bom tempo, mas nada aconteceu.
Foi então que o velho percebeu que aquela figura não era coisa desse mundo, e, sentindo um arrepio percorrer o seu corpo, na companhia apenas da brisa fria da noite, resolveu voltar às pressas para casa.
No outro dia comentou o assunto com alguns conhecidos, foi quando lhe contaram que alguns pescadores já teriam visto a sinistra aparição. Dizem que seria um espírito de um pescador ou de um banhista que em tempos remotos teria se afogado nas águas do rio e, desde então, passou a ser visto na região.
Quem mais o vê são pescadores que não respeitam o período de reprodução dos peixes. Esses, dando de cara com a figura sinistra, saem dali às pressas, abandonando tarrafas, enganchos e varas de pesca.
Ao que dizem, haveria ali, dentro do rio, um tesouro sepultado há muito tempo, de modo que pra encontrá-lo a pessoa precisa encarar sem medo a aparição, que lhe conduzirá sob as águas até o lugar.
As pessoas também dizem que por ali, na margem das águas, nas matas, e aos pés dos morros, na região entre o morro e a fazenda Formosa, podem ser vistas, vez em quando, bolas de luz flutuantes transitando na noite escura. Ninguém sabe direito o que são, até porque, quando vêem essas coisas, as pessoas correm às léguas.
De fato essas coisas do outro mundo metem medo nas pessoas e nem todo mundo tem a coragem do velho Raimundo, pra ir atrás e descobrir o que é. Era ele, de fato, um sertanejo valente como não se vê mais, pois apesar de vez por outra continuar percebendo marmotagens por ali, não tinha medo nenhum, tanto que viveu naquele lugar até o fim dos seus dias.
Ainda hoje, de vez em quando, aparece alguém dizendo ter visto coisas estranhas por ali. Quando contam, contudo, as pessoas riem, não acreditam. Dizem que é história de trancoso.
O povo de hoje em dia acha que sabe das coisas, mas pergunte se eles tem coragem de ir lá de noite. Só falam da boca pra fora. Duvidar, da boca pra fora é fácil… Eu queria ver era eles irem lá conferir, como fez o velho Raimundo.

FONTE:
- COSTA, João Vicente. Entrevista a José Gil Barbosa Terceiro. Altos, 25 de maio de 2019.
- PAIXÃO, Marcus. Memória, Economia, Religião, História e Geografia a partir do Rio Surubim. Campo Maior em Foco. Disponível em: <http://www.campomaioremfoco.com.br/ver_coluna/4/Memoria–Economia–Religiao–Historia-e-Geografia-a-partir-do-Rio-Surubim>. Acesso em 26 de maio de 2019.
- WIKIPÉDIA. Rio Surubim (Piauí) (verbete). Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Surubim_(Piau%C3%AD)>. Acesso em 26 de maio de 2019.
TEXTO: JOSÉ GIL BARBOSA TERCEIRO
ILUSTRAÇÃO: DOUGLAS VIANA
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