Entrevista com Enéas Barros: Escritor piauiense fala sobre sua obra

Foto Eneas Barros 2

ENEAS do Rêgo BARROS nasceu em Teresina, Piauí. Graduou-se em Economia pela Universidade Federal do Piauí. É especialista em Planejamento Turístico pela Faculdade de Ensino Superior de Pernambuco e em Jornalismo e Marketing pela Universidade de Nebraska. Exerce atualmente a função de Coordenador Especial de Turismo da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo da Prefeitura de Teresina, presta Assessoria Especial à cadeia de restaurantes Favorito e é articulista da revista Cidade Verde. É autor de vários livros, sendo os já publicados: Municípios Turísticos Piauienses (Turismo, 1996); Em verdade vos digo (Ensaio, 2002); Piauí, Terra Querida (Turismo, 1996 e 2007); Macauã (Romance histórico, 2008); Piauí Águas (Ensaio, 2010); Origens – Universidade & Humanidade (Ciência, 2012); Nonon, o menino da Lagoa Grande (Romance biográfico, 2012); Parabélum (Romance histórico, 2008 e 2013); 15:50 – A história da menina-vampiro do Piauí (Romance policial, 2013); O turco e o cinzelador (Romance histórico, 2009 e 2013); O homem múltiplo (Biografia de Ocílio Pereira do Lago, 2013); O mistério das bonecas de porcelana (Romance, 2015); O escravo e senhor da Parnahiba (Romance histórico, 2016); e O Boato – Verdade e reparação no caso Fernanda Lages (Livro-reportagem, 2017). Mais cinco livros inéditos, já escritos, aguardam publicação. Em um bate-papo que durou quatro horas, o escritor conversa com o autor do blog dos causos assustadores sobre o conjunto de sua obra. 

José Gil – seu primeiro livro põe em evidencia lugares turísticos do Piauí. Que municípios fazem parte dessa lista? e qual o diferencial que eles apresentam em relação a outros municípios não analisados? que aspectos culturais e naturais você compreende como definidores de uma atividade turística? e qual a importância da administração pública nas mais diferentes esferas em meio a isso?

Enéas Barros – Como sempre trabalhei com Turismo, percebi que não havia uma publicação que reunisse informações da área, o que fazia com que as pessoas peregrinassem por várias repartições, em busca de dados. Na época, a Embratur havia cadastrado 19 municípios e foi eles que me serviram de base: Teresina, Parnaíba, Luís Correia, São Raimundo Nonato, Floriano, Oeiras, Piripiri, Piracuruca, Pedro II, dentre outros. Na verdade, não há padrão para definir um município como turístico, porque alguns grandes atrativos nem sempre são possuidores de infraestrutura, como é o caso do Cânion do rio Poti. Mas é necessário que no mínimo haja transporte para o local, hospedagem e alimentação, para que o Turismo se desenvolva. A administração pública é responsável pela oferta de infraestrutura (segurança, saneamento, comunicação, estradas, sinalização etc.), a empresa pelos produtos e serviços e a sociedade pela valorização e preservação.

José Gil – Além destes mencionados você acredita que outros municípios possuam potencial turístico? além das belezas naturais, outros patrimônios de um lugar podem ser explorados pelo turismo? você enxerga potencial turístico em alguma cidade piauense que até o momento não explorou ainda o seu potencial? E o patrimônio cultural, pode ser explorado com sucesso pelo turismo?

Enéas Barros – O Piauí é riquíssimo em patrimônio turístico, notadamente pinturas rupestres e formações rochosas, além de uma cultura ímpar. Há ainda fortes representações turísticas em Amarante, Bom Jesus, Cristino Castro, Barras e Esperantina, com a Cachoeira do Urubu. Problema é que nem sempre a administração pública enxerga na atividade turística um foco de desenvolvimento e geração de riqueza pela captação de moeda nova.
GRD_763_digitalizar0004José Gil – Eu percebi que no Ensaio em verdade vos digo e no romance histórico Macauã, você enveredou por temas polêmicos que envolvem as religiões. Quais os temas abordados nos dois livros e de que forma isso é trabalhado em cada um deles?
Enéas Barros –  Todos dois abordam a religião como tema central. Em Verdade vos Digo foi escrito para esclarecer o meu pensamento acerca desse tema, com um estudo profundo que fiz à época. E em Macauã, que foi meu primeiro romance, busquei na cidade de Nínive inspiração para criar uma Teresina Mesopotâmica e resgatar o politeísmo que antes de 1.300 a.C. dominava o mundo, especialmente o Egito. E a hostória se desdobra por Sete Cidades, com inspiração no livro de Ludwig Schwennhagen, Fenícios no Brasil ou Antiga História do Brasil.
José Gil – interessante… isso me lembra o projeto do Rafael Noleto: a vila pagã, que tenta resgatar um politeísmo pagão no Piauí, explorando as lendas piauienses (Miridan, Cabeça de Cuia…) como seres divinos, forças da natureza… Algo assim acontece nessa Teresina mesopotâmica, ou seria uma adoção dos deuses mesopotâmicos no Piauí por força da cultura imposta pelos fenícios que, segundo Schwennhagen, estiveram aqui tempos atrás?
Enéas Barros – Sem dúvida. Há algumas pinturas rupestres em Sete Cidades que se reportam ao estilo fenício, com detalhes que não teriam sido feitos por indígenas, mas por povos do Mediterrâneo, e também as formações rochosas que lembram tótens. Duas lendas se entrelaçam em Macauã: Miridan e Zabelê.
José Gil – O romance histórico parece ser um genero que predomina em seus escritos. Porque o interesse em publicar romances que misturam ficção com a história do Piauí?
Enéas Barros – Acho muito difícil fazer ficção pura. Há problemas na condução da história e na coerência de dados, o que leva o autor a um esforço muito grande para não se perder. Cito como exemplo um relógio de pulso numa época de algibeira. Percebi que as pessoas gostam de dois aspectos que são comuns às minhas obras: narrativa bem próxima à forma como as pessoas falam e histórias de conhecimento popular, o que gera interesse especial pela verdade por trás dos fatos. A ficção entra onde não pude comprovar o fato, mas em nada altera a história central.
José Gil – Então você não é simplesmente um escritor ficcional, mas também um historiador, trazendo a tona por meio de romances as características da cidade e da sociedade à época em que os fatos estão ambientados. Isso exige uma pesquisa profunda! Quais as maiores dificuldades que você enfrentou como pesquisador?
Enéas Barros – As maiores dificuldades estão ligadas às fontes de pesquisa. Infelizmente,
cuidamos muito mal de nossa memória. Também encontrei dificuldades em pessoas que detêm a informação. Elas nos enxergam como concorrentes e não repassam o que sabem ou o que têm, como aconteceu quando eu pesquisava para o livro O Escravo e o senhor da Parnahiba. O padre da Igreja de Nossa Senhora da Graça se recusou a me mostrar o seu acervo.
5b31d24d83José Gil – Essa é uma verdade que em minha vã vivência eu também já verifiquei. De fato, muitos se recusam a compartilhar o material que detêm. Mas falando d’O “Escravo e o Senhor da Parnahiba” – um romance histórico que tem como foco a história da família Dias da Silva, principalmente a figura de Simplício Dias, em uma relação triangular com um escravo e sua filha. Como se dá essa relação?
Enéas Barros – Não creio ter havido uma relação entre Carolina Thomázia (a filha de Simplício) e um escravo, embora ela tenha sido assassinada por um. Há muita controvérsia. Quando ela morreu, em 1850, Simplício já havia morrido. O livro é uma saga de 3 gerações. E esse escravo do título não é o que matou Carolina. Esse era músico e foi valorizado por Simplício como tal. Na verdade, Simplício se deixou influenciar pelo Iluminismo e fez coisas notáveis por conta disso, como criar uma orquestra de escravos, trazer a Maçonaria para o Piauí e deflagrar a independência no dia 19 de outubro de 1822, hoje Dia do Piauí.
José Gil – então ele não era uma pessoa cruel como dizem as lendas a respeito dele que falam que ele era tão cruel que virou um corpo seco assombrando Parnaíba em seu cavalo? De onde teriam surgido tais lendas?
Enéas Barros – Não encontrei em Simplício um homem violento. Essas lendas foram registradas no livro Simplício Simplição da Parnaíba, escrito por Josias Carneiro. O que tem ali são absurdos que deram essa imagem a Simplício. Um homem de formação maçônica e de cultura influenciada pelo pensamento europeu do século XIX não poderia ser um cruel. Por isso, no livro o meu personagem foge dessas lendas. Tive como conselheiro o historiador Diderot Mavignier, profundo conhecedor da história de Parnaíba. Ele me abriu seu acervo e me repassou boas informações.
José Gil – Em Parabélum, você aborda um outro personagem cercado por uma aura mitológica: o motorista Gregório. O Gregório que você encontrou em suas pesquisas, é o mesmo das histórias que o povo conta?
Enéas Barros – Nem de longe. A vida de Gregório não contém elementos que o credenciassem à santidade. Era um motorista e nada mais. O mito vem apenas do suplício. Gregório me foi descrito por uma antiga namorada sua, Maria Teresa, que tinha 104 anos quando a entrevistei e morreu 3 meses após a entrevista. Como disse o matador de Gregório: “transformei um pecador em santo”.
parabelumJosé Gil – Bem típico dos santos populares piauienses. São santificados apenas pela morte sofrida. Mas o que o livro traz de novidade sobre a morte do motorista?
Enéas Barros – Na verdade, Gregório morreu com um tiro de Parabélum no ouvido, dado pelo tenente Florentino Cardoso, e não de fome e sede, como diz a crença popular. Ele realmente foi proibido de beber e comer pelo seu algoz, mas não foi isso que o levou à morte. Tive acesso no Arquivo Público ao atestado de óbito dele e da criança que ele atropelou.
José Gil – Então a arma do crime foi uma Parabélum – arma muito usada pelos nazistas na segunda guerra. Como os fiéis reagiram às suas constatações?
Enéas Barros – O livro teve excelente aceitação. Não tive reações contrárias, até porque tem um personagem que valoriza a crendice e faz promessas, que é Mariazinha. Minha história não alterou em nada a crença das pessoas.
José Gil – Eu vi que “O Turco e o Cinzelador” trata da vida do homem que construiu as portas da igreja São Benedito, agora tombadas pelo IPHAN. Dizem que ali tem muito mais que essa história. Quem são os personagens que titulam a obra? Qual a relação entre eles? E que revelações podem ser encontradas no livro?
Enéas Barros – A história principiou com Sebastião Mendes, o cinzelador das portas da igreja. Encontrei 4 referências a ele: no livro Frei Serafim de Catânia, de Elias Martins; na auto-biografia de Higino Cunha; no livro História de Teresina, de Clodoaldo Freitas; e na Resolução 630, da Assembleia, concedendo a ele uma bolsa para estudar na Escola de Belas Artes do Rio, a mesma em que estudou o pintor Debret. Mas era muito pouco para gerar um romance, por isso nasceu o turco, que acabou tomando mais espaço na história. As revelações estão contidas na relação de Sebastião com a igreja e no papel de Frei Serafim em Teresina.
700f1e0d91José Gil – O que você pode nos falar sobre a construção da igreja? Quem a construiu? Quem é Frei Serafim – personagem do livro? O que havia no alto da Jurubeba antes da construção da igreja? Há referência no livro sobre a fixação do cruzeiro da avenida Frei Serafim?
Enéas Barros – A igreja foi um projeto de Frei Serafim, que era arquiteto, formado em Milão. Ele já vinha construindo igrejas pelo Nordeste e chegou a ser prefeito de Olinda. A construção foi de 1874 a 1886, durou 12 anos. Quando o frei chegou a Teresina, montou uma palhoça para morar na região da praça Pedro II, de onde avistava o alto da Jurubeba. E decidiu que lá era adequado para a construção. Se não me engano, no alto existia um cemitério. Eu soube que na época da construção de um posto de gasolina ao lado da igreja, operários descobriram corpos enterrados, mas não tenho informação fidedigna sobre isso. A história não tem ligação com o cruzeiro da avenida.
José Gil – é que eu tinha visto que na revista Cadernos de Teresina que ele remontava à época da construção da igreja, em que os fiéis iam ao rio pegar água e barro para a construção… 
Enéas Barros – Isso é fato. Muita gente ajudou na construção da igreja, inclusive a avenida se abriu por essa busca pela água.
José Gil – Mas vamos em frente! Ambientado em uma outra época, “O mistério das bonecas de porcelana” é também um romance histórico? o que há de real nele? apenas o velho casarão? qual a proposta do livro?
Enéas Barros – Essa história surgiu quando eu estava escrevendo a biografia de Juvêncio Alves de Carvalho. Um de seus parentes morava em um casarão na praça João Luiz Ferreira, conhecido como Palácio das Lágrimas. Uma das filhas colecionava bonecas de porcelana e continuou fazendo isso até a fase adulta. Tive curiosidade e criei a história, que é uma ficção. O livro é um exercício para a compreensão de problemas na infância, a atenção que os adultos devem ter com os filhos. É o desenvolvimento de uma mente que precisa de ajuda.
MISTÉRIO BONECASJosé Gil – vi que ele é todo focado do ponto de vista da personagem central, a menina que coleciona bonecas, mas a atenção que os pais deveriam ter a ela é em razão de tormentos psicológicos típicos da juventude ou em relação ao perigo de abusos por terceiros?
Enéas Barros – As duas coisas. Os pais devem acompanhar as reações infantis. Há sempre alertas que são perceptíveis. O pior de tudo é que a grande maioria dos abusos vem de pessoas conhecidas e muitas vezes parentes.
José Gil – mas havia o perigo de abuso já naquele tempo? como você trabalha a figura do agressor? como é retratada a Teresina dos anos 50 na obra? qual o conceito que os personagens da trama fazem da menina?
Enéas Barros – O abuso é bem mais antigo do que imaginamos e em algumas sociedade é até oficializado. Uma criança judia está apta a casar com 12 anos e meio, como aconteceu com Maria, mãe de Jesus. O livro Lolita, de Nabokov, é um exemplo. O agressor é um pedófilo que desenvolveu a violência com um trauma de infância. As reações da personagem aos abusos não são levadas a sério pela família, por isso ela volta o foco para si mesma. Teresina dos anos 50 foi retirada da vivência de familiares, de fotografias de época e da minha própria experiência na casa de meu avô Fontes Ibiapina.
José Gil – Hum… por isso você fala com tanta propriedade de Nonon (apelido de Fontes Ibiapina) no romance biográfico “O menino da lagoa grande”…
Enéas Barros – Verdade.
NONONJosé Gil – O que você pode nos contar sobre a figura do seu avô no livro. Como o menino Nonon se tornou um dos maiores escritores que o Piauí já viu?
Enéas Barros – Índole. Embora tenha começado a estudar já taludo, Nonon tinha veia literária que não o abandonou nem quando passou 8 meses em uma cama de hospital, depois do acidente que lhe alterou o caminhado. Nonon escrevia com maestria, numa linguagem regionalista facilmente identificada com os seus leitores.
José Gil – Mas a vivência não influiu em nada? quais as experiências que ele vivenciou que considera determinantes na construção de seu caráter e de que forma isso influiu em sua escrita? você saberia quantificar os seus escritos? e qual seria o seu preferido?
Enéas Barros – Toda a obra de Fontes Ibiapina é pautada em suas vivências, no interior de Picos e em Teresina, como fez com Palha de Arroz. Dois contos dele são memoráveis: “Memórias de um Canário” e “Cidade sem Reboco”. Ele produziu 18 livros e deixou 18 inéditos. Meu livro preferido é “Chão de Meu Deus”, de contos.
José Gil – Que influência Nonon (Fontes Ibiapina) exerceu sobre Enéas Barros como ser humano e como escritor?
Enéas Barros – Muita influência, especialmente o apego pelos livros e o respeito a uma biblioteca. Também o estilo descontraido da narrativa. Tive muita vivência com meu avô, em uma infância saudável com meus tios, que eram da minha idade. A gente não ia pra cama sem ouvir histórias que ele nos contava. Às vezes tirávamos ele das visitas, para levá-lo nos contar histórias. Os Fontes são grandes contadores de história.
José Gil – Fiquei curioso… que tipo de histórias ele contava para as crianças da família ao pô-las para dormir (talvez eu não tenha outra oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a intimidade de dois grandes escritores piauienses)?
Enéas Barros – Eram histórias de princesas e castelos, de lendas, do Aladim e sua lâmpada maravilhosa, além de historias de trancoso e assombração que ele próprio inventava.

José Gil – legal, infelizmente a cultura da nossa sociedade está perdendo esse costume que aguça a imaginação das crianças. Continuando: Alguns livros seus abordam temáticas policiais e vi que boa parte deles diverge muito da versão apresentada pela imprensa. Sobre esses livros, vou começar perguntando sobre o bombástico “O BOATO” que aborda o caso da Fernanda Lages, a maior investigação policial já efetuada no Piauí. Porque o título?

Enéas Barros – Um boato foi responsável pela grande curiosidade popular pelo caso. Se esse boato não tivesse existido, o caso teria sido mais um em meio às centenas que acontecem em Teresina, caindo rapidamente no esquecimento
Tudo partiu de uma intriga de um jornalista com a família Castro. Infelizmente, a sociedade condenou o engenheiro Jivago Castro sem lhe dar a chance de defesa e sem ver a retratação de seus algozes.
José Gil – você parece estar certo disso e. pelo que tenho visto na mídia e analisando o caso como advogado que eu sou, sou levado a crer também dessa forma, até porque o jornalista não consegue explicar essa história direito. Mas as suas investigações indicam algum suspeito? Você acredita na tese de homicídio levantada à época pelos promotores responsáveis pelo caso?
livrodocaso1-600x880Enéas Barros – Não encontrei evidências ou materialidade para um homicídio. Creio no inquérito policial, que concluiu pelo suicídio, e digo isso no livro. A família não quer acreditar nisso e insiste que a polícia esconde o assassino. Os promotores foram altamente irresponsáveis, ao alimentarem a sociedade com teorias absurdas, quem nunca comprovaram. Os dois pareciam estar afinadis com o jornalista, para sustentarem um suspeito que diziam conhecer. Os promotores nunca passaram à polícia o que diziam saber e saíram do caso deixando a sociedade sem respostas e um inocente condenado.
José Gil – Quais os efeitos do boato do jornalista e das teorias da conspiração que circularam à época sobre Jivago? O livro mostra o que aconteceu a Jivago depois da acusação?
Enéas Barros – O livro tem 400 páginas e um ano de pesquisa e narrativa. Os efeitos foram devastadores, fazendo de Jivago uma lenda urbana. Ele passou muito tempo deprimido, mas conseguiu superar. Pelo que entendi, ele espera que Ubiraci Rocha e Arimatéia Azevedo se retratem, como fez Eliardo Cabral em entrevista que me concedeu para o livro, e que o Ministério Público reconheça que ele não tem implicações com esse caso. Na verdade, os promotores como representantes da sociedade insinuaram teorias e não as desfizeram, manchando a credibilidade de sua instituição. Não creio que eles façam isso. O jornalista sustenta que não foi responsável pelo boato e o promotor é muito vaidoso, para voltar atrás e desfazer uma versão que sustentou por tanto tempo.
José Gil – Então, nunca houve uma leitura de gps do celular de Jivago? Isso me faz pensar em quantos pobres coitados já foram condenados por terem sido perseguidos pela mídia de forma injusta… A família de Fernanda, se pronuncia em seu livro? O que eles dizem sobre tudo isso?
Enéas Barros – Essa história do GPS foi uma má interpretação. A policia rastreava um suspeito que havia ligado pra Fernanda pouco antes dela morrer e descobriu que ele estava muito longe do local. O celular do Jivago foi cruzado com centenas de celulares de amigos da Fernanda e da própria Fernanda. Nunca o celular do Jivago teve ligação com qualquer um deles. Entrevistei o pai e a tia da Fernanda, mas ela depois de 3 meses me desautorizou a publicar o que me disse. Depois de publicado o livro, ela declarou que não leu e que o livro era dirigido para inocentar o Jivago, como se eu não devesse fazer isso. O livro é uma defesa da verdade dos fatos. E essa verdade é o que está nos autos. Fora dos autos é especulação.
José Gil – 15:50, seu outro romance policial, conta a história por trás do caso da menina vampira de floriano. O título se remete ao horário em que ela tirou a vida de suas vítimas. Porque resolveu contar a história? ela realmente tinha porfiria (vampirismo)? tinha algum transtorno de personalidade ou era uma criminosa comum apesar dos requintes cruéis com que cometeu o crime?
Enéas Barros – A menina-vampiro não sofre de porfiria. Ela é uma psicopata de nível 4, segundo dr. Humberto Guimarães, e psicopatas não têm cura. Essa história de matar e beber o sangue é mais comum do que a gente imagina. Tive acesso ao processo e segui a sequência de ações que ali estão. O prefácio é assinado pelo dr. Nolêto, que à época era juiz da infância e da juventude em Floriano. O livro é hoje adotado em vários cursos de Direito e em colégios.
livrodeneas1-360x539José Gil – Esclareça-nos o que é um psicopata nível 4!
Enéas Barros – É aquele que atinge o último nível, quando mata. Segundo o livro Mentes Perigosas, da Ana Beatriz Barbosa, nós estamos cercados de psicopatas e não percebemos.
José Gil – Você chegou a conversar com ela antes de escrever o livro?
Enéas Barros – Conversei com ela enquanto escrevia o livro e estava pesquisando em Floriano. Em uma de minhas viagens, passei na casa em que ela morava, em Demerval Lobão, e conversamos. Está tudo no livro.
José Gil – ela cumpriu pena ou foi internada em um hospital psiquiátrico?
Enéas Barros – O Piauí não possui presídio para esse tipo de caso, por isso ela ficou na Penitenciária Feminina. Ela passou 11 anos presa.
José Gil – ela foi submetida a um exame criminológico (onde fazem uma avaliação psicossocial do prisioneiro) antes de ser liberada?
Enéas Barros – Ela foi libertada por força de um Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública em Brasilia. Ela era avaliada semestralmente pela equipe do dr. Humberto, cujos resultados apontavam sempre para o transtorno. A liberdade dela foi um cochilo do Ministério Público, que não se manifestou a tempo.
José Gil – Quem era a menina vampiro depois de 11 anos de prisão quando você a conheceu em Demerval Lobão? você chegou a perceber algum indício do transtorno? teve medo?
Enéas Barros – Medo eu tive, mas ela não se mostrou uma pessoa agressiva. Alguns gestos e conversa um pouco desconexa passam a impressão do transtorno. O psicopata age com covardia, em momento de distração da vítima, e não parece agir sem uma motivação. Isso me deixou mais tranquilo, porque não havia motivo para que ela me agredisse. Como psicopatas são vaidosos e só pensam em si, dei uma caixa de chocolate pra ela e ganhei um beijo… na bochecha!
Foto Eneas BarrosJosé Gil – Eu vi que você, no livro Piauí Terra Querida, entre outras coisas abordou algumas lendas do Piauí. Como alguém que já trabalhou o assunto, o que você acha do projeto Causos Assustadores do Piauí?

Enéas Barros – Eu acho uma bela iniciativa, essa de preservar as tradições culturais. Noto que é cada vez maior a necessidade de deixarmos registrado o passado e a memória, para que não nos transformemos numa sociedade de presente e futuro. O projeto é um resgaste permanente disso, e o Piauí é rico, um celeiro de casos emblemáticos e interessantes que precisam ser do conhecimento de todos.

José Gil – Existem projetos para o futuro?
Enéas Barros – Muitos. Tenho 4 livros inéditos e estou trabalhando um romance que vai se passar na Idade Média, na Europa, envolvendo Cristão Novos e o caso do massacre dos Távora, em Lisboa, com reflexos na Dinastia Tudor, no Reino Unido. Serão 300 anos de história…
José Gil – muito bom! vou querer saber mais sobre isso depois. gostaria de encerrar a entrevista, dizendo que estou honrado pela oportunidade de conversa e agradecendo muito por isso, encarrando com uma última pegunta: qual o seu conselho para quem deseja iniciar uma carreira como escritor?
Enéas Barros – Eu diria que a leitura é essencial para quem quer escrever, para poder se inspirar e descobrir um estilo. Muitas pessoas escrevem, mas têm vergonha de mostrar. Eu diria: percam a vergonha e se mostrem. Tirem das gavetas as produções, mostrem aos amigos, aos parentes e não se deixem inibir pelas criticas, tendo sempre o bom senso à frente. Escrever é prazeroso e requer muita responsabilidade com a informação. 
José Gil – foi uma viagem longa. mas pra mim nem percebi essas quatro horas. muito obrigada!
Enéas Barros – É assim, quando a conversa é boa. Foi um grande prazer conversar com você. Perguntas inteligentes e contextualizadas. Obrigado. Vou ali fazer uma boquinha. Abraço e boa noite.

Um comentário em “Entrevista com Enéas Barros: Escritor piauiense fala sobre sua obra

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  1. Acho interessante a dinâmica de escrita do Enéas de pegar fatos históricos e ir preenchendo as lacunas entre os acontecimentos. Dele li o 15:50 e o Turco e o Cinzelador, deu para perceber que ele tem uma veia meio jornalística/investigadora.

    P.S.1: Estou um pouco chocado porque encontrei mais alguém que leu o livro dos Fenícios no Piauí.

    P.S.2: Um corpo seco montado em um cavalo… visualmente isso é fantástico.

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